quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Sábado.

Como todo sábado preguiçoso, o almoço era inexistente em casa e então recorríamos a bares com self-service. Já era tarde e uma avalanche de pessoas na mesma preguiça que a nossa já tinham levado a comida, sobrando-nos os restos. Mas o que a fome não transforma em uma arte gastronômica?

Pois bem, colocamos nossos restos e sentamo-nos naquelas mesas amarelas com cadeiras que ao entardecer se empilham e formam tronos gloriosos para qualquer criança. Na mesa à frente, dois homens e um menino estavam sentados há muito tempo. Os homens já tinham formado uma fileira de garrafas de cerveja no chão, suas vozes denunciavam, falavam mole e arrastado.

Como alguém que assiste televisão enquanto almoça, eu fiquei assistindo aos dois conversarem e mesmo estando diante dos olhos deles, não perceberam minha intromissão.

O mais velho tinha olhos azuis e um cabelo longo e castanho, calças características da feira e uma blusa de botão, era o porta voz da situação e narrava suas estripulias enquanto o álcool afetava seu sistema nervoso. E assim dizia, com maior orgulho.

- Uma vez, estava em uma festa de 15 anos, comprei um colar de beija flor muito bonito, e fui entregar para a aniversariante, me desequilibrei e cai em cima dela. Aqueles “icebergs” amorteceram minha queda, mas não garanto a dela – e riu ao lembrar-se da garota, impecavelmente bonita caída no chão, com um bêbado e um beija flor em cima dela – todos me perguntavam se eu não senti vergonha, mas que vergonha teria para sentir? Ela já estava no chão e eu, cheio da cana, para sentir vergonha de ter caído.

Os dois riram até os olhos lacrimejarem, da pobre aniversariante que no mesmo momento poderia estar amaldiçoando o infeliz que caiu em cima dela. E riram mais um pouco da cena.

E pararam de rir, e não acharam mais graça, e não esboçaram mais nenhum sorriso. Cada um olhou para um pedaço do céu pintado acima, e seus olhos entristeceram, seus sorrisos murcharam e lembraram-se de tudo que o amigo álcool tinha apagado de propósito. Eles não gostavam daquela realidade, tão sóbria, tão cruel, e tão injusta com dois bêbados de sábado à tarde. Essa tal vida era melhor sem a tal vida.

Os olhos saíram das nuvens e entraram no olhar de cada um deles, e sabiam do que precisavam. Sorriram novamente, levantaram mais um copo cheio daquele suco amarelo, espumante e esquecedor, esquecendo a dor, bateram os copos ao alto, e com um pouco derramando em suas mãos, colocaram tudo aquilo para dentro de seus corpos, e novamente, esqueceram.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

I

E tinha um violão
Sempre preso em mãos
E percorria rápido
As cordas
Que já não feriam seus dedos
Dedos já calejados
Assim como teu peito
Calejado de arfar,
De amar,
Esperar.