terça-feira, 26 de outubro de 2010

Rosa.

O verde mais bonito que já vi, dentro de um seco e árido solo rachado pelo sol.

Os olhos verdes mais bonitos que já vi, dentro de uma pele seca, enrugada e rachada pelos efeitos do sol.

E assim era a senhora que vi sentada ao lado do semáforo.

A loucura de sua pobreza já não permitia que ela fosse pedir esmolas.

Ela gritava por um tal de Oscar.

Oscar nunca apareceu.

Ela ria de suas lágrimas.

As lágrimas que nunca escorreram.

Seus olhos verdes clamavam pelo choro, imploravam por umas tais lágrimas, que poderiam umedecer seu terreno envelhecido e terroso.

Queria bater forte nela, para ela chorar de dor, e as lágrimas enfim beijassem sua face livremente.

Mas ela não chora de dor.

Agora vejo o verde do semáforo, menos verde que seus olhos.

Adeus, minha querida senhora.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Manchas.

Quando abri meus olhos, só o que pude ver foram as belas estrelas que dançavam lá em cima, bailavam como antigas dançarinas que nunca esqueceram de dançar. Senti um balanço engraçado, e percebi então aonde estava, em cima de uma tábua de madeira, no meio do mar, indo de lá pra ca, do jeito que as ondas quisessem me levar. Respirei fundo e sorri, meus olhos queriam se fechar, mas eu sabia que não era para eu fazer isso. Vi algo vermelho em meu peito, mas era apenas algum bichinho do mar que estava grudado em minhas roupas, deixei-o quietinho e continuei sentindo aquele doce balanço. Meus olhos queriam se fechar, e eu não agüentei.

Ao abrir novamente aqueles que não deveriam ter se fechado, vi um sol querendo nascer pela janela, as nuvens estavam arroxeadas e o por do sol estava lindo. Estava deitado em um quarto bonito, com uma cama bem larga, eu estava totalmente despido, apenas com um lençol branco cobrindo o que tinha que ser coberto, os lençóis estavam sujos de prazer. Escutei o som da água caindo do chuveiro, e vi a silhueta de uma bela mulher pelo box. Lembrei-me que era a mulher da minha vida, e que após termos passado uma intensa noite juntos, saciando os desejos um do outro, tinha ido lavar seu corpo escultural ao nascer do dia, quando a claridade lá de fora nos dizia que nosso tempo juntos estava perto de acabar. Vi no meu peito uma mancha vermelha, parecia ser batom, mas não me importei. Droga, meus olhos queriam se fechar de novo, e se fecharam.

Um céu azul, com nuvens gordinhas e brancas estava brilhando acima, estava deitado na grama, não foi difícil reconhecer o parque ao meu redor, conseguia ver a copa das árvores, escutar o riso das crianças que muitas vezes se confundia com o canto dos pássaros que voavam por ali. Ao meu lado um garotinho lindo estava na mesma posição que eu, deitado com os braços na cabeça, suas bochechas eram coradinhas, seu cabelo era angelicamente loiro e tinha um sorrisinho bobo, também mirava as nuvens acima de nós. Era meu filho. Meu filho com a bela moça do quarto bonito. Eu falava com ele, fazia perguntas, comentários, e ele nada respondia, como se não estivesse me escutando. Vi uma mancha vermelha no meu peito, acreditei ser uma frutinha que estourou na minha camisa. Pouco me importei e não lutei muito contra meus olhos se fecharem.

O silêncio perfurava meus canais auditivos e doía mais que o pior dos barulhos. Entretando aquelas belas estrelas continuavam ali, bailando pra mim, praticamente sorrindo. Passei a mão no peito e senti um líquido viscoso e quente, olhei para os meus dedos sujos daquilo e vi que era um líquido vermelho.

Era sangue.

Eu estava morrendo.

Não era um animalzinho, não era batom, não era uma frutinha, era só meu sangue escorrendo do meu peito durante minhas quimeras póstumas. Foi tentando reagir a minha morte que acabei morrendo. Aquele que queria meus bens matou-me para ver meu sangue, e depois saiu correndo, fugiu e me deixou ali no asfalto frio, daquela última noite fria beirando a inconsciência dos meus últimos minutos. Deixando pra trás tudo que um dia importou pra mim.

Agradeço apenas as estrelas por estarem dançando, aqui no meu leito.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Victória

Era uma vez uma linda menina, uma linda menina que tinha olhos castanhos bem grandes, que tinha cabelos castanhos bem grandes, e algo em seu passado igualmente castanho e grande.

Essa linda menina era demasiadamente linda, porém era tímida e extrovertida ao mesmo tempo, mas como? Não conseguirei te explicar. Essa linda menina contagiava a todos com seu sorriso irreverente, quem a via, imaginava que ela não tinha problema algum.

Mas essa linda menina sofria mais do que era linda. Seu pai beirava a insanidade de um ser em sã consciência. Esse louco ameaçava a todos que tentavam salvar a linda menina, esse louco mandava aquela doce criatura xingar a mãe de puta, todos os dias, esse louco fazia tantas loucuras, que regozijavam o complexo de sua maluques.

E a linda menina, o que ela fazia para lidar com tudo isso? Eu não sei, eu não sei da onde uma menina tão pequena e jovem tira tanta força para agüentar tanta coisa, aquela linda menina não se deixava abalar, diante de tanta angustia e sofrimento ela só conseguia contagiar mais e mais pessoas para perto dela, ela só conseguia sorrir para quem não olhava pra ela.

Minha doce e linda menina só consegue amar.